Em audiência pública marcada pela presença maciça dos Assistentes de Promotoria e de Procuradoria, ficou evidenciada a ilegalidade do desvio de função a que estão sendo submetidos os servidores ocupantes destes cargos no Ministério Público do RS. “Uma anomalia difícil de entender” classificou o deputado Jeferson Fernandes (PT), presidindo a audiência, referindo-se ao fato de que cabe exatamente à instituição zelar para que situações como esta não ocorram em órgãos públicos. O parlamentar de início também criticou a ausência de representação do MP no debate.
A atividade ocorreu nesta quinta (30), as 11 horas, na Assembleia Legislativa do RS, realizada pela Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Casa.
Desrespeito ao parlamento
Iniciando sua fala, o presidente do SIMPE-RS, Alberto Ledur também frisou que a ausência da administração representava um desrespeito aos servidores, ao parlamento e à sociedade. “O legislativo é um importante espaço de mediação que aponta para uma solução para o problema, uma ilegalidade”, disse o dirigente.
Ledur lembrou que o sindicato tem pautado a questão desde 2008, época em que foi realizado um abaixo assinado com apoio de promotores objetivando uma solução. A ideia, segundo ele, era construir um projeto de lei que acabasse com o desvio de função. “Mas passaram dois, três anos, vários outros projetos foram encaminhados pelo MPRS, nenhum tratando da questão dos assistentes. Já tivemos projetos tratando do realinhamento de motoristas, mais recentemente dos auxiliares administrativos e artífices, mas a administração continua ignorando a situação dos assistentes”, afirmou.
Em 2015 o sindicato buscou retomar a proposta e até dezembro houve alguma sinalização de diálogo, chegando a ser criado um grupo de trabalho para tratar o tema. Só que, desde então, a administração tem ignorado as entidades e os servidores, tanto que sequer compareceu à audiência pública. O presidente do Sindicato reiterou que apenas em uma das ações ajuizadas uma servidora deverá receber cerca de R$ 1,2 milhão. “Imaginem se todas as ações forem deste valor, a imensa penalização nas contas públicas por conta justamente da inércia do MPRS em resolver esta questão”, alertou Ledur.
Segundo ele, a busca do parlamento nesta audiência pública se dá exatamente com o objetivo de estabelecer uma mediação para que se estabeleça uma negociação com vista ao realinhamento de mais de 200 servidores ocupantes do cargo.
Um trabalho que não é remunerado
O deputado Pedro Ruas (PSol), se solidarizou com os servidores e denunciou que a prática “se trata de uma forma de lucro do MP, que usa um trabalho pelo qual não remunera”. Para o parlamentar, ao MP não faz diferença do ponto de vista do orçamento, já que o impacto deste realinhamento seria pequeno, mas, diz ele, para os servidores faria imensa diferença. “O MP é constitucionalmente o fiscal da lei, mas não fiscaliza a si próprio”, acrescentou.
A diretora do SIMPE-RS e protagonista na organização da audiência pública, Ivanisa Fagundes Bonatto, destacou a forte participação dos assistentes e frisou que a luta está só começando. “Estamos levando à sociedade a nossa situação, que além de ser uma injustiça, é também uma questão de humanidade”.
Em sua manifestação, o advogado Aloísio Zimmer, cujo escritório é responsável pela ações que dizem respeito aos assistentes, frisou as dificuldades da caminhada, notadamente em função do enfrentamento ao Ministério Público, fazendo referência a ausência dos deputados à audiência pública. Segundo ele esta será uma luta coletiva que atenderá a interesses individuais. “Só vão nos levar a sério se mostrarmos engajamento, se estivermos unidos”, destacou.
Para o jurista, o Ministério Público, o Judiciário, o Tribunal de Contas e outros órgãos atuam rapidamente quando identificam algum direito atinente aos membros, que sempre são reconhecidos, independente de questões orçamentárias, inclusive administrativamente e com retroatividade. Mas não é essa a postura quando se trata dos direitos dos servidores.
Ele lembrou que alguns promotores estão ao lado dos servidores, o que tem sido muito importante, mas é preciso buscar outros apoios, como dos deputados. “Temos um longo caminho a percorrer e será preciso muita coragem e mobilização. Acredito na nossa caminhada via judiciário, mas trata-se de um direito que poderia ser mais rapidamente reconhecido com uma solução política, que levasse a um acordo, com outro nível de articulação”.
Para o presidente da APROJUS, Cristiano Linhares, a situação dos assistentes ultrapassa a questão do desvio de função e passa para o campo do assédio e da violação de direitos de todos. “Este problema existe desde os primeiros concursados e é preciso analisar seriamente os encaminhamentos que serão colocados nesta audiência. Quando se trata de botar o dedo na ferida dos outros, o MPRS é rápido, mas não tem a mesma atitude com seus servidores. Por que não veio aqui debater?”, questionou ele.
Justificativa rasa
Responsável pela realização de um estudo sobre a situação do desvio de função dos assistentes, incluindo o impacto financeiro, o representante do Instituto de Planejamento e Assessoria (IPLAN), Cândido Godói, destacou que vê hoje um grande preconceito em relação ao serviço público e desvalorização do servidor, pautado no discurso raso da falta de recursos. Segundo ele, é preciso derrubar a tese do “orçamento”, onde nada é possível por falta de orçamento.
Em sua apresentação, Godói destacou que a diferença do realinhamento dos assistentes será da ordem de R$ 1,2 milhão para o MPRS, o que, levando em conta apenas as despesas de pessoal, representaria algo em torno de 2,1%, isso se todos fossem enquadrados de uma única vez. Sobre o orçamento total do órgão seria muito menos. “É razoável, é possível e é técnica e economicamente viável este realinhamento”, afirmou.
Trata-se, diz ele, de qualificar o serviço público. “Investir nas pessoas é diferente de investir em máquinas e o serviço público é feito por pessoas e não podemos nos apequenar neste debate”, finalizou.
Representando o Sindjus-RS, o diretor Davi Pio da Silva dos Santos, destacou que as mazelas, como assédio e exploração da força de trabalho, são as mesmas sofridas pelos servidores do Judiciário. Segundo ele, sempre há recursos para a concessão de privilégios e retirada de algumas obrigações para manter estes privilégios. Davi Pio também criticou a negativa do MPRS de liberar os servidores para acompanhar a audiência, um direito com previsão legal. “Tudo de ruim que o Judiciário faz, que o MPRS deveria romper, assim como o TCE, acabam fazendo igual”, evidenciou ele.
No final da audiência, diversos servidores fizeram relatos de situações de assédio moral, adoecimentos (cerca de 80% dos assistentes fazem uso de fármacos, segundo estudo realizado), sentimento de exploração, de cerceamento, entre outros, e reforçaram que não ficarão calados frente a um estado usurpador de seus direitos.
Encaminhamentos
Como encaminhamento foi definido que será feita uma coleta de assinatura entre os deputados de requerimento para remessa de projeto de lei pelo MP e também será solicitada audiência dos deputados com o Procurador-Geral de Justiça para debater a situação dos assistentes.
O SIMPE-RS continuará acompanhando os desdobramentos desta audiência pública e parabeniza os assistentes que romperam com a intimidação imposta pelo MPRS ao negar o direito à liberação para participar de atividade de seu interesse. Desde já convoca todos a permanecerem mobilizados em defesa de seus direitos.
Assessoria de Comunicação
30/06/2016 16:49:15