Recentemente, o Supremo Tribunal Federal julgou o recurso extraordinário nº 1.072.485, da relatoria do Ministro Marco Aurélio, que gerou o tema de repercussão geral nº 985, ementado como: “É legítima a incidência de contribuição social sobre o valor satisfeito a título de terço constitucional de férias.”
O caso trata da incidência de contribuição social sobre o terço constitucional de férias, instituto previsto no artigo 7º da CF/88 e se refere ao pagamento de um acréscimo de 1/3 do salário pago pelo empregador para o empregado antes desse sair de férias. A contribuição que o caso se refere é a do inciso I do artigo 195 da CF/88, que diz respeito ao financiamento da seguridade social, e, especificamente no inciso I, trata sobre a contribuição patronal.
Em outras palavras, a repercussão geral é sobre a incidência ou não de contribuição social patronal sobre o terço constitucional de férias, que, conforme ementa, foi considerada constitucional.
Adentrando um pouco mais no caso, o processo era um mandado de segurança interposto pela empresa Sollo Sul Insumos Agrícolas LTDA em face do Delegado da Receita Federal do Brasil em Cascavel, vinculado a União. O processo se referia a diversas verbas, sendo que, ao final, o recurso extraordinário interposto pela União se referia apenas ao terço constitucional de férias, o auxílio doença e o aviso prévio indenizado, mas, só foi considerada a repercussão geral quanto ao terço de férias constitucional. Sobre essa verba, a 2ª turma do TRF da 4ª região havia julgado como não incidente a contribuição previdenciária sobre.
Dando sequência, o STF, ao reconhecer a repercussão geral, havia delimitado que a controvérsia se dava principalmente quanto a natureza jurídica da verba para saber se há incidência ou não.
O ministro relator, ao proferir seu voto, ressaltou alguns julgados anteriores da corte, como a súmula 688, que considera legítima a incidência de contribuição previdenciária sobre o 13º salário; o julgamento do RE nº 487.410, que reconheceu que o auxílio-transporte possui caráter indenizatório e, por isso, não incide a contribuição sobre; e o tema de repercussão geral nº 20 que se refere ao alcance o termo “folha de salário” do inciso I do artigo 195, que é o mesmo inciso e artigo desse processo, e, no caso do tema 20, foi considerado que é necessário a habitualidade no recebimento da verba para haver o desconto previdenciário sobre.
Desses julgamentos, o ministro relator conclui que para incidir o desconto patronal sobre uma verba ela: 1) precisa possuir natureza remuneratória e 2) deve ser um ganho habitual. Assim, o Ministro relator entendeu que estão presentes as duas características, já que o terço constitucional de férias seria uma “verba auferida, periodicamente, como complemente à remuneração. Adquire-se o direito, conforme o decurso do ciclo de trabalho, sendo um adiantamento em reforço ao que pago, ordinariamente, ao empregado, quando do descanso”. Ainda, que o afastamento de férias é apenas temporário e que o vínculo empregatício permanece.
A única ressalva feita é quanto ao adicional de férias indenizadas, porque sobre isso há expressa previsão legal da não incidência de contribuição sobre, além da verba ser considerada como de natureza indenizatória.
Em conclusão, o decidido pelo Supremo Tribunal Federal no tema 985 de repercussão geral se refere ao regime geral de previdência social, porque, quanto aos servidores públicos, do regime próprio de previdência social, prevalece o julgamento do recurso extraordinário nº 593.068 e tema de repercussão geral nº 163, que diz: “Não incide contribuição previdenciária sobre verba não incorporável aos proventos de aposentadoria do servidor público, tais como ‘terço de férias’, ‘serviços extraordinários’, ‘adicional noturno’ e ‘adicional de insalubridade’”.
Neste outro caso, referente aos servidores, o STF analisou especificadamente sobre a incidência de contribuição previdenciária sobre verbas não incorporáveis aos proventos de aposentadoria e não entrou no mérito do debate sobre a natureza das verbas.
Além disso, há previsão expressa na Lei n. 10.887, desde 2012, que se refere a não incidência de contribuição previdenciária sobre o terço de férias para o RPPS. Inclusive, sobre essa regra, o STF considerou que, apesar da previsão legal ser de 2012, ela apenas seguia a orientação da jurisprudência dos tribunais superiores e, consequentemente, ao que é possível extrair da Constituição.
Por fim, é importante destacar que no seu recurso extraordinário a União, julgado no tema 985, faz a devida distinção de que a regra difere quanto aos servidores públicos e aos trabalhadores celetistas, isso porque para os servidores públicos o benefício se refere à última remuneração, enquanto que para os celetistas “não há vinculação entre os aportes financeiros vertidos ao sistema e os benefícios futuros”.
Dessa forma, apesar de o STF ter decidido pela incidência de contribuição patronal sobre o terço constitucional de férias, para os servidores públicos a regra é outra e não deve incidir desconto sobre a verba.
Alice Lucena e Juliana Urnau fazem parte da banca do escritório Cassel Ruzzarin Santos Rodrigues Advogados, especializado na defesa do servidor público.