Reforma Administrativa: Comparativo com texto constitucional atual revela mudanças profundas propostas pela PEC de Bolsonaro e Guedes

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O escritório Metapolítica, que realiza a assessoria parlamentar da Fenamp e da Ansemp, preparou um quadro comparativo entre o texto atual da Constituição Federal de 1988 e as alterações sugeridas pela Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 32/2020, de autoria do governo Bolsonaro e que propõe uma profunda reestruturação do serviço público no país. Entre as principais alterações estão o fim do regime jurídico único no funcionalismo público; o fim da estabilidade para cargos com atividades administrativas, técnicas ou especializadas; e o aumento do poder presidencial para extinção e transformação de cargos, e para reorganização de autarquias e fundações e extinção de órgãos, sem necessidade de passar pelo Congresso Nacional.

As primeiras alterações propostas na PEC estão no Art. 37 do texto constitucional. A emenda altera os princípios da administração pública, que hoje são de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência; e inclui as premissas de imparcialidade, transparência, inovação, responsabilidade, unidade, coordenação, boa governança pública e subsidiariedade.

No mesmo artigo, o texto original também é alterado para incluir a figura dos “vínculos” com a administração pública no inciso I. Essa é a figura da relação entre o trabalhador e o Estado durante o período de concurso público, que também tem seus princípios alterados pela proposta. Para investidura em cargo com vínculo por prazo indeterminado ou cargo típico de Estado, o aspirante deve passar pelas etapas de a) provas ou provas e títulos; b) cumprimento de período de, no mínimo, um ano em vínculo de experiência com desempenho satisfatório; e c) classificação final dentro do quantitativo previsto no edital do concurso público, entre os mais bem avaliados ao final do período do vínculo de experiência. Ou seja, as avaliações do funcionário durante o período de experiência compõem a sua nota final de classificação no concurso público.

Outra mudança importante está no inciso V, onde a PEC abre espaço para ampliar as atividades para as quais os servidores podem ser contratados sem concurso público. No texto atual, a Constituição estabelece que esses contratos podem se dar apenas para direção, chefia e assessoramento. Já pela proposta do governo federal, os cargos de “liderança e assessoramento”, contratados por processo seletivo simplificado, poderão ser destinados também a atribuições “técnicas”. Além disso, o texto estabelece uma figura vaga, onde os cargos sem concurso podem ser destinados também para atividades de fim “estratégico”.

No inciso XXIII, o projeto estabelece uma série de vedações a direitos hoje estabelecidos no serviço público em maior ou menor grau. A PEC proíbe a concessão de: a) férias em período superior a trinta dias pelo período aquisitivo de um ano; b) adicionais referentes a tempo de serviço; c) aumento de remuneração ou de parcelas indenizatórias com efeitos retroativos; d) licença-prêmio, licença-assiduidade ou outra licença decorrente de tempo de serviço, independentemente da denominação adotada, ressalvada, dentro dos limites da lei, licença para fins de capacitação; e) redução de jornada sem a correspondente redução de remuneração, exceto se decorrente de limitação de saúde; f) aposentadoria compulsória como modalidade de punição; g) adicional ou indenização por substituição sem a efetiva substituição de cargo em comissão, função de confiança e cargo de liderança e assessoramento; h) progressão ou promoção baseada exclusivamente em tempo de serviço; i) parcelas indenizatórias sem previsão de requisitos e valores em lei, exceto para os empregados de empresas estatais, ou sem a caracterização de despesa diretamente decorrente do desempenho de atividades; e j) a incorporação, total ou parcial, da remuneração de cargo em comissão, função de confiança ou cargo de liderança e assessoramento ao cargo efetivo ou emprego permanente.

No Art. 39 são trazidas alterações que retiram autonomia dos estados e municípios no que tange à remuneração e administração dos quadros próprios de pessoal. Hoje, a Constituição define que “A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão conselho de política de administração e remuneração de pessoal, integrado por servidores designados pelos respectivos Poderes”. Já pela proposta apresentada ontem (03), uma lei complementar federal deverá estabelecer regras gerais de gestão de pessoas, política remuneratória e de benefícios, ocupação de cargos de liderança e assessoramento, organização da força de trabalho no serviço público, progressão e promoção funcionais, desenvolvimento e capacitação de servidores, e duração máxima da jornada para fins de acumulação de atividades remuneradas.

Uma das principais alterações está no Art. 41. A Constituição, atualmente, determina que todos os servidores nomeados para cargo de provimento efetivo em virtude de concurso público sejam estáveis após três anos de efetivo exercício. Já a proposta de Guedes e Bolsonaro modifica esse quadro, estabelecendo o direito à estabilidade apenas para “o servidor que, após o término do vínculo de experiência, permanecer por um ano em efetivo exercício em cargo típico de Estado, com desempenho satisfatório”. O texto também amplia as possibilidades de demissão de servidores estáveis, possibilitando a perda do cargo em razão de decisão proferida por órgão judicial colegiado, além das possibilidades anteriormente previstas pela legislação.

Além das profundas mudanças nas carreiras públicas, a PEC também prevê um grande aumento de poder para o presidente da República, ampliando as possibilidades de governança por decreto. Somando-se às hipóteses já previstas, o presidente poderá, sem autorização prévia do Congresso, realizar a criação, fusão, transformação ou extinção de Ministérios e de órgãos diretamente subordinados ao Presidente da República; extinção, transformação e fusão de entidades da administração pública autárquica e fundacional; transformação de cargos públicos ocupados ou vagos; e alterar e reorganizar cargos públicos efetivos do Poder Executivo federal e suas atribuições.

Estes são apenas alguns pontos das profundas mudanças que o governo federal pretende fazer na administração pública em todo o país. Além da PEC, a equipe econômica já anunciou que tem outros projetos de lei prontos, que serão enviados ao Congresso em etapas seguintes à aprovação das mudanças na Constituição e que devem aprofundar o processo de precarização das carreiras e do serviço público. A PEC 32/2020 seguirá, agora, para a avaliação da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), onde um dos membros irá apresentar o seu relatório sobre a constitucionalidade da matéria. Se aprovado o parecer favorável à sua admissibilidade, a matéria seguirá à Comissão Especial, que deverá ser instituída por ato da Mesa Diretora da Casa com a finalidade.

A Fenamp e a Ansemp já estão trabalhando contra as propostas do governo junto ao Congresso Nacional. Na tarde de quinta-feira (03), as entidades se reuniram com o deputado federal Lincoln Portela (PL/MG) para tratar do tema e, nesta sexta-feira (04), as direções acompanham a reunião da Frente Mista da Reforma Administrativa, onde será apresentado o roteiro de atividades e a agenda prioritária da Frente.