Associação emite nota sobre polêmicas no MPES

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CALE-SE

Pai, afasta de mim esse cálice Pai, afasta de mim esse cálice Pai, afasta de mim esse cálice De vinho tinto de sangue

No ano de 1978, Chico Buarque lançava a música Cálice, que se tornou um dos mais famosos hinos da resistência ao regime militar. A analogia fantástica da sonoridade existente entre “cálice” e “cale-se” a fez tão eficaz como uma canção de protesto, remetendo ao ideal de fim da censura, mordaça que silenciava aqueles que se indignavam com a repressão e a violência do governo autoritário.

A composição, apesar de datar do século passado, no período da ditadura militar no Brasil, faz-se tão atual em face das respostas do Ministério Público do Estado do Espírito Santo às manifestações contrárias à Lei Estadual nº 11.023/2019, de iniciativa do procurador-geral de Justiça, que cria e privilegia diversos cargos comissionados de livre nomeação em detrimento da investidura por concurso público.

É possível fazer paralelo do “cale-se” da canção ao desastroso ofício circular da Comissão Permanente Processante (COPP) que orientava as chefias imediatas dos servidores a comunicarem qualquer pedido de abono ou falta justificada, sob o argumento de que o servidor estaria participando de manifestações contrárias a um projeto institucional, ao qual, conforme ofício, os servidores deveriam cumprir com o seu “dever de lealdade”.

A Assempes questiona como é possível manter-se leal a uma cortina de fumaça que ameaça a utilização de abono ou falta abonada, direito do servidor efetivo? Como manter-se fiel a um projeto de lei, tramitado em regime de urgência, que não implementa nenhuma das mudanças pleiteadas pela Assempes para o Plano de Cargos e Salários dos servidores do MPES, apesar de anos de discussão, requerimentos e diálogos com a instituição?

É possível, ainda, relacionar o sentido do “cale-se” à manifestação de um servidor efetivo em desacordo com a lei aprovada. O controle do discurso de protesto e de indignação deu-se, após várias manifestações de apoio por outros servidores da instituição, com a derrubada do e-mail institucional. E, mais recente, com a instauração de diversos procedimentos pela COPP contrários àqueles servidores que responderam à insatisfação do colega. Ao apoio demonstrado pelos servidores à mensagem inicial de indignação, resta também a semelhança da estrofe como beber dessa bebida amarga, bebida essa comungada por todos os que são contrários à aprovação do projeto de lei.

Tragar a dor também remete à imposição do autoritarismo e ausência de transparência quanto ao atendimento dos pedidos dos servidores para a melhoria do Plano de Cargos e Salários. Engolir a labuta seria a não manifestação dos trabalhadores, a supressão da expressão daqueles que lutam por igualdade. Mesmo calada a boca, resta o peito, porque, apesar da proibição da expressão, o sentimento permanece e o inconformismo está no sangue, no coração. Silêncio na cidade não se escuta, desejo da instituição, sem a expressão de seus valiosos servidores, sem manifestação daqueles que merecem o respeito e o zelo institucional. Mas não será assim.

A Assempes prossegue na luta e reconhece a importância da livre circulação de ideias e defende que algo diferente disso resulta em obstáculos à democracia, tão cara à nossa sociedade. Não há democracia sem a previsão de organização para reivindicação de direitos ou manifestação contrária ao sistema estabelecido. É preciso respeitar o contraditório e a livre opinião.

As vozes dissonantes não podem ser caladas pela força de uma estrutura hierárquica conservadora. A liberdade de expressão é um direito fundamental que remete à liberdade de manifestação, indispensável à participação popular na sociedade em que vivemos.

Por fim, a Assempes se orgulha daqueles que representa e acredita que com UNIÃO e FORÇA podemos muito mais. Sem nenhum direito a menos!

Talvez o mundo não seja pequeno Nem seja a vida um fato consumado Quero inventar o meu próprio pecado Quero morrer do meu próprio veneno.

Vitória, 28 de agosto de 2019.